Mi Ojo Viejo

Mentiras lindas em palavras lindas, preparadas no calor da hora, temperadas com idéias rápidas para se saborear sem pressa...

28.11.06

As distorções do ensino religioso...


O dicionário Aurélio define escola como "estabelecimento público ou privado onde se ministra, sistematicamente, ensino coletivo” e local de “estudo, conhecimento, saber”. Como sempre as palavras escondem muitas mentiras ou a sociedade muda mais rápido do que os dicionários, pois a escola (entendida aqui como os níveis básicos e médios do ensino) vem se convertendo ao longo do tempo em mero instrumento de socialização e controle (e hoje, com raras exceções, as instituições privadas, para as elites, priorizam mais a criação de uma rede de relações entre seus membros do que os conteúdos e as instituições públicas, para as massas, objetivam somente assegurar a contenção de corpos e desejos que se mantém domesticados durante algumas horas mesmo que analfabetos).

Para além dessas redefinições, as escolas funcionam muitas vezes como laboratórios do “deixa que eu chuto” da administração pública (é impressionante a quantidade de inovações de gestão e de projetos que são apresentados e abortados ao ritmo das mudanças políticas nas diferentes esferas municipais, estaduais e federal).

Nesse contexto de esvaziamento de sentido do ensino,talvez reflexo de um milenarismo crescente entre outros fatores, perde-se uma das maiores riquezas da escola que está em oferecer aos alunos a oportunidade de travarem contato com vivências e informações que o seu cotidiano não permitiria, e que possibilitariam uma verdadeira ampliação de horizontes e possibilidades pessoais e coletivas, no campo da formação, da informação e da profissionalização.

Entre os atuais problemas enfrentados pela escola, ganha destaque recente a questão da inclusão do ensino religioso no currículo escolar da rede pública, pauta levantada pelo MEC no desejo de atender a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) e a Constituição de 1988 (reflexo da presença do lobby evangélico e de pressões da Igreja Católica).

A separação entre Estado e Igreja é um fundamento básico do sistema republicano, que justifica inclusive a idéia de liberdade religiosa uma vez que o Estado não intervêm naquilo que é visto como escolha pessoal do cidadão.

A inclusão do ensino religioso é, usando palavra cara aos pastores de bumbo na praça, uma abominação porque:
1) garante espaços de visibilidade social para instituições religiosas às custas do Estado, ou seja, do erário público e de instituições e políticas públicas, ocupando espaços e recursos que seriam melhor utilizados para outras atividades fins da escola;
2) a formação do corpo docente nos moldes atuais não contempla conteúdos necessários ao entendimento de práticas religiosas diversificadas como as presentes na sociedade brasileira, o que permitiria “achismos” de diferentes tipos; e,
3) as aulas ou reforçam dogmas (que por definição são excludentes e restritos a cada religião ou seita) ou abordam temas ecumênicos que poderiam estar presentes em conteúdos de outras disciplinas (como tolerância, ética, etc.).

Se não bastasse esses poucos argumentos, é inegável que mais mal foi causado ao mundo por crentes do que por descrentes e, sem dúvida, a população brasileira tem sofrido problemas como fome, desemprego, violência e outros, mais por falta de educação do que de fé.

(Publicado em Pronto! Revista de Cultura, www.revistapronto.com.br , em 22/11/2006)