Mi Ojo Viejo

Mentiras lindas em palavras lindas, preparadas no calor da hora, temperadas com idéias rápidas para se saborear sem pressa...

8.11.07


Universidade hoje: os centros de excelência e a periferia.

Existem dois níveis de diferenças entre as diversas instituições de ensino superior de caráter público no País hoje, as de capital humano e as de estrutura institucional.

Em termos de estrutura institucional, não se pode deixar de reconhecer que em relação à Universidade no Brasil existe uma discussão já longa sobre o projeto possível de ensino superior no País, e dentro disso, o papel do ensino público... aqui não é o lugar pra alongar essa discussão, mas em linhas gerais está se implantando um crescimento de campi e vagas com uma clara diferenciação das instituições na qual a imensa maioria teria uma função mais profissionalizante (no caso das c. humanas, vinculadas aos cursos de licenciatura) e certos “centros de excelência” manteriam a tradição de pesquisa.

Logicamente como a imensa maioria dos professores tem doutorado (e os novos a serem incorporados tbém terão, pq o número de doutores em busca de emprego é enorme), e estão todos inseridos em um ciclo de formação atrelado ao Lattes, a produção intelectual-acadêmica continua existindo nos dois tipos de instituições, embora com volume e impacto bastante desiguais. (Inevitável constatar que na maioria das vezes uma instituição já consolidada tem grandes vantagens em termos de estrutura física – imagine o custo e a viabilidade de se reproduzir uma biblio como a do IFCH e um acervo como o do AEL, da UNICAMP, p. ex.!)

Em termos de capital humano os fatores têm um nível de complexidade maior. As grandes instituições pela sua tradição, estrutura e poder acabam se mostrando não só muito atrativas para os docentes – pelo que representam como capital simbólico, oportunidades, estruturas físicas e material humano (grupos de pesquisa, institucionalização das práticas, visibilidade da produção, discentes com melhor formação e preparo, etc.) – como também para os discentes – quase pelos mesmos motivos.

Felizmente o trabalho intelectual embora tenha uma dimensão social/coletiva (no sentido de que o pertencimento a tal instituição ou grupo pode favorecer sua produção) também tem outra extremamente individual (no sentido de que é possível e na maioria das vezes o pesquisador produz lendo e escrevendo de maneira solitária, recorrendo aos pares mais para uma legitimação e/ou trocas eventuais). Isso significa que se uma grande instituição oferece condições ela por si só não é garantia de que alguém produzirá algo digno de nota, mas também que estar em uma instituição “pequena” ou “periférica” não significa um impedimento para se produzir algo interessante.

Logicamente, “a realidade da Unicamp (e poderia se dizer da USP, da UFRJ, etc.) é muito diferente daquela das federais do Nordeste (ou de outras instituições que possam ser colocadas como ´pequenas`ou ´periféricas´)” por dois básicos: as razões estruturais já citadas e o capital humano que acumularam e que são capazes de continuar a acumular (novos docentes e discentes com melhores formações).

O destaque que alunos de instituições ´pequenas`ou ´periféricas´ podem obter em um “centro de excelência” decorre do fato de que esses alunos já foram previamente selecionados e se estão nesses programas de pós e centros de pesquisa – vindo de onde vieram – é porque são tão bons ou melhores do que os “nativos”, dominam os mesmos referenciais do campo intelectual – com o crescente número de programas de pós-graduação, de congressos e de recursos de telemática isso se torna cada vez mais fácil – e são dotados de referenciais simbólicos e expectativas semelhantes.

Fatores como a institucionalização da pesquisa e o acesso a verbas, derivada da maior agilidade nas relações com os órgãos de fomento internos e externos e da solidez quantitativa e qualitativa do programa de pós-graduação, não só criam condições favoráveis como também atraem aqueles interessados em compartilhar de tais condições (na forma de aprendizagem ou de docência).

No entanto, se o sistema trata de forma estanque e hierarquiza tais diferenças, ele também oferece espaços de permeabilidade que tornam possíveis as trocas entre suas partes (através dos eventos, das possibilidades de pós-docs e assemelhados, dos grupos de pesquisa que envolvem diferentes instituições, etc. etc. etc.). De qualquer modo, na minha opinião, não se pode nem imaginar que a origem é determinante e o destino é inevitável em qualquer situação desse tipo, e nem que as diferenças não existam.